São 45 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza, o que equivale a cerca de 15% da população – de qual população? Dos Estados Unidos. Não bastasse essa notícia já ser aterradora o suficiente, o presidente Obama tenta aprovar no congresso um pacote de 445 bilhões de dólares para a criação de novos empregos, injetando mais dinheiro num sistema que simplesmente não funciona mais.
Os Estados Unidos vivem uma das piores crises de sua história. A Espanha vive índice recorde de desemprego. A Grécia está quebrada. O Oriente Médio acende um barril de pólvora atrás do outro. Os estudantes enfrentam a polícia no Chile. A China imita a trajetória dos países desenvolvidos (sic) e destrói suas riquezas naturais, ao mesmo tempo em que cria um abismo entre novos pobres e novos ricos. Cenas dantescas de violência tomam conta das ruas de Londres. Será que já não existem sinais suficientes de que o modelo econômico baseado na ideia de que para que um ganhe é preciso que outro perca entrou em colapso irreversível? Quantos balanços ainda terão que ser maquiados? Quantos crimes ambientais precisarão ser cometidos? Quantos assassinatos, quantos estupros, quantas cenas de abandono e desprezo?
Que as empresas não têm mais como entregar lucros crescentes a seus acionistas, isso não deveria surpreender a ninguém. O que espanta mesmo é que um sistema que se alimenta da crença de que é possível crescer indefinidamente tenha sobrevivido por tanto tempo.
Viver permanentemente a serviço do matar ou morrer nos tornou os piores dos seres habitantes desse planeta. Lutamos pela destruição, acreditando que nossa sobrevivência depende da eliminação do outro – seja esse outro um ser humano, uma empresa, um país, o que for. No entanto, como é justamente o outro que nos legitima, é contra nós mesmos que atiramos as palavras duras, os tapas na cara, as pedras, as balas, as bombas.
As empresas estão doentes, as pessoas que dependem delas estão doentes, os governantes que se mantiveram no poder à custa da miséria humana estão doentes. Quem ousa fazer essa afirmação num mundo onde quem pensa diferente é considerado ingênuo ou louco? E, no entanto, cada vez que eu, ingênuo e louco, faço essa afirmação, encontro muitos ingênuos e loucos para me ouvir – não, não apenas para me ouvir, mas para eu ouvir. Muitas pessoas assistem a ruína de nossa civilização como a conhecemos, mas ninguém as escuta. Entre a ingenuidade e a loucura, elas preferem o silêncio. Mas basta que elas não mais se sintam sós para desembestarem a falar. Falam o que veem, e o que veem soa desconexo demais para ser compreendido, porque elas veem o mesmo castelo ruindo, só que cada uma de um ângulo diferente. É preciso ouvi-las com a mente e o coração abertos, com a candura das crianças e a abertura dos loucos e ingênuos – loucos e ingênuos que, em sua maioria, morrem incompreendidos, mas que, historicamente, são os que trazem os ventos da mudança. Sim, somos muitos, somos fortes, não há nada a temer.