A vida é algo que não me pertence totalmente. Sou seu administrador, responsável direto por várias facetas, como cuidados com a saúde, evitar os vícios e as situações de risco. Tenho o poder de criar novas vidas quando contribuo para uma gestação, mas fico conivente com o bem-estar destes seres, meus filhos.
Nada é tão certo neste mundo como saber que a vida, mais cedo ou mais tarde, vai cessar. Para alguns seres humanos, ela dura apenas minutos, horas ou dias. Para outros, ela termina com idade muito avançada. O período entre o nascimento e a morte é chamado de vida.
A morte pode ocorrer por minha culpa, o que é um crime terrível, ou por fatores que escapam de meu controle. Antecipo sua chegada se me entregar a vícios como o fumo, bebida, uso de drogas ou existência conturbada; quando trabalho demais prejudicando o mínimo de horas de sono necessário, ou quando trabalho de menos, vivendo em indolência e inércia; quando uso medicamentos por conta própria sem consultar meu médico para fazer os exames preventivos.
A morte também pode ocorrer por motivos alheios à minha vontade, como um acidente causado independente de minha vontade: desastre de avião, atropelamento quando me encontro na calçada, agressão por meliantes, etc.
Eu não tenho medo da morte, ela é para mim como o dia em que férias bem aproveitadas terminam. Nos primeiros dias de férias, não fico pensando no último, mas tomo os devidos cuidados para que este período seja dadivoso e não se interrompa por antecipação. Assim, sei que minha vida um dia vai terminar, não fico curtindo negativamente este fato, mas não faço como alguns amigos meus que nem se lembram que ela existe e levam uma vida desregrada que pode ser motivo para antecipação de sua própria morte.
Quando alguém vem me comunicar um falecimento, geralmente usa frases como “fulano descansou”, “beltrano passou desta para melhor”, “ele foi para o reino do Senhor”. Pensam que a palavra morte não deve ser pronunciada, como se isso fosse motivo de azar para si próprio. Eu sempre digo: ele morreu.
Meu cérebro tem a capacidade de liberar energia positiva sempre que acredito que sou um vencedor, e me proponha a achar soluções e não simplesmente me queixar do problema. Ou energia negativa quando o pessimismo prevalece.
Há aproximadamente 40 anos, tive um problema de câncer julgado incurável. Confesso que, no momento em que recebi a notícia por intermédio de meu médico que me deu no máximo 90 dias de vida, fiquei esmagado, desnorteado. Mas meu cérebro imediatamente mostrou-me milhares de seres humanos que morreram repentinamente sem ter ao menos o tempo que me era possível. E nesse exato momento senti que naqueles três meses de vida eu poderia resolver todos os problemas e achar soluções possíveis ou disponíveis. E com o otimismo que sempre foi o meu forte, procurei tratamento adequado, tomei providências para deixar meu passivo e ativo financeiro sem problemas e pensei: bola pra frente, sou um vencedor, vivi até hoje com muita alegria, se minha vida chegou ao fim, não será por isso que vou me entregar: vou achar uma solução porque EU QUERO CONTINUAR VIVENDO COM SAÚDE. Consegui tratamento adequado, fiz cinco anos de acompanhamento e, graças a Deus e ao meu otimismo, estou aqui fazendo este relato.
Sempre comento com meus amigos que os grandes homens, ricos, poderosos, que nasceram há 130 anos, não estão mais conosco. E nós não estaremos aqui daqui um dia, um mês, um ano, dez anos, cinquenta anos!
Estou com 77 anos, sou cardíaco, estou em tratamento de tireóide, próstata, câncer de pele, já coloquei uma ponte de safena e uma mamária, operei as carótidas, extrai o baço e vesícula, tenho problemas de coluna mesmo fazendo minha fisioterapia e ginástica diária, mas faço corretamente uso dos medicamentos e exames preventivos receitados e solicitados.
Faço de cada dia uma vida porque enquanto ele transcorre eu ando, falo, ouço, sinto, amo, convivo com meus familiares e amigos, sou útil ao meu círculo de amigos, vejo o sol, a lua, as estrelas, sinto frio, calor, alegria, tristeza, evito a raiva, o ódio, o nervosismo, os ambientes negativos, contribuo com a natureza, com o bem-estar daqueles que estão próximos, não faço promessas tipo carregar uma cruz de madeira ou subir escadarias de joelho, prefiro, dentro de meus limites, doar um quilo de arroz que seja ou um prato de comida ou uma modesta ajuda financeira a instituições de amparo ao próximo sem fazer alarde.
Quando hoje à noite eu for me deitar, vou somente, em minhas preces, agradecer muito pelo “dia-vida” que ganhei e nada vou pedir ou exigir para amanhã. Se meu amanhã me for permitido, saberei viver mais um “dia-vida”.
Este relato não é uma ação tenebrosa ou agourenta, apenas demonstra como eu encaro a vida e a morte. Para nós, humanos, o período pode se estender até ao que chamamos de idade avançada. Nos anos 40, a expectativa média de vida era de 50 anos, hoje, portanto, quem passou de 70 já está no lucro, mas devemos considerar que ganhamos uma sobrevida de mais de 20 anos, e para mim a sobrevida já está em 27 anos! Quantos seres humanos não viveram nem seus primeiros 27 anos!
Gostaria que meus amigos, ao lerem este meu sincero relato, possam fazer como eu: viver HOJE, desde a aurora até o amanhecer tudo o que está disponível no momento. Faça como nas férias, aproveite cada dia sem lembrar que elas terminarão, mas esteja preparado para o seu final de maneira tranquila e inteligente.
*José Oswaldo Victor Betti, meu tio por parte de mãe, escreveu este texto entre março de 2008 e setembro de 2011, vindo a falecer no dia 22 de janeiro de 2012, em decorrência de complicações causadas por um tumor no pâncreas.