Até o início do século XVII, acreditava-se que a Terra era o centro do Universo. Ai de quem discordasse dessa verdade! O cientista Galileu Galilei, que, além de inventar o telescópio, aprofundou as idéias de Copérnico e estabeleceu o heliocentrismo, pagou caro por defender a sua verdade: teve seus livros proibidos e foi condenado pelo Santo Ofício (nome mais suave para Santa Inquisição) à prisão por tempo indefinido.

Claro que, nesse caso, é fácil ver que Galileu é quem estava certo. É fácil hoje, pois a humanidade, com a ajuda da Igreja, acreditava piamente que a Terra era, de fato, o centro do Universo. Em passado mais remoto, acreditou-se durante muito tempo que a Terra era plana.

Pode isso? Claro que pode!

Porque a verdade é uma questão relativa. No caso de Galileu, o relativo está no fato de que a verdade evolui historicamente. Em outras palavras, a verdade é uma hoje, mas pode ser verdade amanhã.

Galileu é um cientista e usava um telescópio para poder ajudá-lo a construir sua verdade. Apesar de nós não sermos cientistas – pelo menos, não somos quando estamos discutindo a relação com o outro -, nós também usamos uma espécie de telescópio. A diferença é que o nosso telescópio só enxerga aquilo que a gente quer, porque ele tem lentes exclusivas e um alcance bastante limitado.

Cada um de nós tem seu próprio conjunto de lentes e a única coisa comum a todas as lentes é que, de uma forma ou de outra, elas distorcem a realidade. Aí vou recorrer à ciência, no caso, a ciência da ótica, que é um ramo da Física que estuda a luz ou, mais amplamente, a radiação eletromagnética, visível ou não. A ótica explica os fenômenos de reflexão, refração e difração, a interação entre a luz e o meio, entre outras coisas. Colocando em bom Português, quando a luz atinge um meio físico, como uma lente, por exemplo, a refração modifica a velocidade da luz e, com isso, altera a percepção da realidade. Isso é científico.

Só falta lembrarmos dessa verdade quando estivermos defendendo a nossa verdade em contraposição à verdade de outra pessoa. A grande verdade é que os dois estão vendo a realidade de maneira distorcida, com suas próprias lentes. Por isso, mais interessante do que defender uma posição pessoal, seria pegar emprestada a lente do outro, para conseguir ver o que ele ou ela está vendo. Assim, pode-se até se surpreender ao perceber que, no objeto específico da discussão, a lente do outro é melhor para enxergá-lo do que a sua. E, em outra situação, sua lente pode funcionar melhor.

Como Galileu fez ao criar o telescópio, o melhor seria contrapor várias lentes diferentes, o que ajuda a ter uma idéia mais próxima da verdade. Quanto mais lentes conseguirmos colocar em nosso telescópio, maior o alcance e mais chances teremos de nos surpreender com verdades que a gente sequer imaginava.