A primeira definição de ego que surge quando consultamos o dicionário é o “eu de qualquer indivíduo”. E “eu”, além de primeira pessoa do singular, é a “entidade metafísica da pessoa” – metafísica que, a grosso modo, é a parte da filosofia que estuda a essência dos seres; o que nos traz de volta ao conceito de ego que, para a psicologia, é simplesmente (sic) a experiência que o indivíduo possui de si mesmo. E aí – ufa! -chegamos ao que nos interessa!
A primeira experiência que temos de nós mesmos surge em algum momento de nossa primeira infância, quando começamos a definir nossos contornos, as fronteiras que delimitam onde nós terminamos e começa o outro. Quando gritamos “eu!”, portanto, também queremos dizer “eu não sou você!”. “Afinal, “eu” não é só diferente de “mundo”, é o contrário de “mundo”, como se “eu” pudesse estar fora dele.
Essa história, que parece pura piração, é, de fato… piração pura! A piração vem da constatação de que, apesar de a tática da separatividade ser essencial para a formação de nossa consciência individual – leia-se “ego” –, ela deveria ser abandonada quando adquirimos recursos mais sofisticados para entender e estabelecer nossa inter-relação com o mundo. É como o leite. O único mamífero que toma leite depois que ele deixa de ser necessário para o desenvolvimento é o ser humano. Viciamos em leite na mesma medida em que não conseguimos mais abandonar esse pequeno e mesquinho ego, para quem só existe ele, no centro de tudo.
Para percebê-lo, basta observar nosso comportamento quando nos sentimos, de alguma forma, ameaçados. É o ego infantil que está lá, bufando de raiva por se sentir contrariado. “Não doeu”, grita o sapeca, depois de levar uma tremenda surra.
Ele é reação emocional em estado primitivo, quase que reptiliano. Se fosse razão, perderia o sentido. O ego é, por essência, narcisista, mas, como os vampiros, foge de espelhos. Enxergar-se tão pequeno lhe seria mortal. E a exemplo de um caçador de vampiros, é com o espelho que temos que confrontá-lo. Ele precisa enxergar o papel ridículo que faz quando nos obriga a agir como bebês hiper-carentes. É preciso mostrar a ele que crescemos e que não mais precisamos de suas armas para nos defender das adversidades da vida. E, como bons pais, propomos um acordo com nosso amiguinho: nós o protegemos e ele fica livre para brincar, mas apenas brincadeiras de criança, porque a fase de brincar de gente grande já passou…