Escrito por Lídia Colavitti
Inexplicavelmente somos assim; irremediavelmente seduzidos pelo flagelo do sobressalto, da insônia, da inapetência – em contraponto à certeza do porto seguro. É certo que buscamos segurança, mas quando conquistada, nos sentimos prisioneiros dela. No fundo, não queremos endereço certo – gostamos de andar a ermo.
É por isso que admiramos os aventureiros, os esportistas radicais. Nada de caminhadas! Queremos escalar picos altíssimos, lançar-nos a milhares de pés de altura, preferivelmente fazendo acrobacias antes de abrir o pára-quedas.
Sim, na paixão testamos nossos limites minimizando a distância entre os extremos: o divino de mãos dadas com o profano, o certo confundido com o errado, o verdadeiro com o ilusório, o exclusivo com o trivial.
Na paixão tudo é superlativo: muitíssimo envolvente. O calor não aquece, queima. A água não molha, encharca. Tudo em demasia. Nos intoxicamos de desejo, ciúme, vaidade… E, apesar de exacerbadas nossas imperfeições, sentimo-nos divinizados.
A paixão é assim – desafia a lógica e a racionalidade e por isso os que dela se esquivam, vangloriam-se de sua imunidade porque paixão é risco e finitude; quando vivida integralmente, tem sua morte anunciada.
Dentre estes, há ainda os que, cumpridores de seus deveres e fiéis ao compromisso com uma escolha antiga ou impensada, optam pela aceitação de uma vida sem sobressaltos (e inconfessável tédio) pelo medo de se verem perseguidos pela insuportável culpa. Ela, que tal qual uma sombra – sem corpo, mas com forma definida – se avizinha ameaçadora com a possibilidade de transformar heróis em vilões. Outros se furtam da possibilidade de escolha devido ao receio mesquinho de um eventual desamparo num momento de doença, solidão ou necessidade. Pobres criaturas! Apegadas à certeza do previsível, optam por viver meia vida, pois, ao tolherem seus movimentos, permitem que sejam extraídos de sua existência o valor da descoberta, da dor e do aprendizado.
Existem, no entanto, criaturas para quem o amor não se esgota. Permanece em constante movimento sem se desgovernar – apenas cresce mansa e continuamente em direção ao infinito.
Sábios sem saber, estas pessoas constroem uma relação espontânea que independe de qualquer esforço ou intenção. Simplesmente deixam que ela aconteça e se encaixe com naturalidade na categoria das coisas divinas para as quais não existem fórmulas, nem explicação.
eu para mesangem
eu para mesangem